Sempre me chamou a atenção a vida dos padres.
Fiz primeira comunhão e a figura do padre sempre me pareceu estranha.
Note que um padre não casa (não teria teoricamente problemas sexo-afetivos), não trabalha (problemas financeiros) e mora na igreja (não tem problemas de moradia). Esse modelo dá ao padre a possibilidade de estar acima dos outros humanos.
Que dá a ela aquele ar de despreocupação e falta de tensão que todas as pessoas têm, que é justamente esse ar angelical, uma pessoa fora do mundo terreno, sem interesses, que representaria a ideia da Igreja Católica.
Vemos pelos diversos escândalos sexuais, principalmente de pedofilia, o quanto isso é falso e hipócrita.
A construção das sociedades pós-medievais, com a chegada da república, foi, no fundo, a desconstrução na vida pública da figura do humano desinteressado, sem interesses próprios.
Marx, a meu ver, apesar de ateu e contra as religiões, questionou as religiões, que chamou de ópio do povo, mas manteve o conceito de que existe na terra homens bons e maus, e os bons, que lutam contra o mau, são desinteressados.
Um revolucionário marxista tem muito de padre.
São pessoas aparentemente desinteressadas em benefÃcio pessoal, estão acima do bem e do mal, são os padres sem batina, que querem apenas fazer o bem ao próximo.
O sistema republicano/capitalista é justamente o oposto disso.
O mérito e seu sucesso é apostar que o ser humano nunca é desinteressado.
E que a melhor forma de se conviver na sociedade não é escondendo estes interesses debaixo do tapete, mas que eles possam ser negociados, de forma aberta e transparente, à luz do dia.
Ou seja, se eu parto do princÃpio de que todo mundo tem seus interesses, vamos deixar claro como a regra do jogo será jogada.
Muitos dirão que existem padres do bem e revolucionários do bem.
E que existem pessoas realmente desinteressadas na sociedade.
Não nego, apesar de não ter tido o prazer de conhecê-los.
Porém, o que posso dizer é que uma sociedade não pode se estruturar pela exceção, mas sim pela regra.
E quanto mais aberto for o interesse de cada um, mais transparente será o processo de negociação.
Uma sociedade, portanto, mais justa não é aquela que se esconde os interesses, mas justamente aquela que constrói modelos para que eles possam ser negociados com mais transparência.
É isso, que dizes?