Somos muito menos inventivos quando se trata de problemas humanos que de problemas tecnológicos – Arnold Toynbee – da minha coleção de frases.
Bom, ainda refletindo sobre as recentes declarações de Saramago aqui, ele diz:
“Não tenhamos ilusões, a internet não veio para salvar o mundo”.
E isso é uma questão interessante, pois a rede, a meu ver cria, querendo ou não, uma descentralização de poder por trazer um ambiente informacional mais aberto.
Vem para equlibrar a forma que trocamos informação, conhecimento, em um processo constante de desintermediação.
Ou seja, o que vemos agora, já ocorreu antes e vai ocorrer depois.
Foi assim com a escrita que desintermediou a fala.
O livro impresso que popularizou a escrita, antes fechada em um livro manuscrito, caro e maludo para se carregar.
- Desintermediamos os padres, ao traduzir bíblias.
- O telefone ao tirarmos do circuito as telefonistas de filme de Chicago da década de 30.
- Ou mesmo, os bibliotecários, com as fichas catalográficas.
Isso tudo em nome da velocidade.
Temos tirado do nosso caminho há séculos tudo que nos atrapalha para a troca livre da informação.
Quanto mais somos no planeta, mas precisamos de flexibilidade e dinamismo, para inovarmos e podermos sustentar 7 bilhões de bocas.
É da natureza humana: sempre desintermediar para sobreviver.
Até aqui uma relação de causa e efeito não diagnosticada completamente pela ciência, mas que a rede tem nos evidenciado mais e mais essa tendência.
Não é à toa que vemos tanta gente jovem (e outros nem tão jovens) motivada e engajada com a rede, com o software livre, com o acesso livre às publicação e produção intelectual de toda ordem, com a ampliação do uso da Web pela população mais pobre, etc.
São atos e gestos que nos levam para direções humanas, que nos engajam em lutas interessantes, nos motivam e mesmo nos dão a sensação da mudança de um mundo A para o mundo B.
Isso é um fato inegável.
Estamos entrando como diz o Chris Anderson em uma mudança de época e não apenas vivendo uma época de mudanças.
Citando Lévy no livro Cibercultura, que diz algo assim:
A rede é uma janela de oportunidade que podemos usar para ajudar na direção da mudança. É um projeto aberto e não fechado, que depende do engajamento das pessoas em usá-la para desenvolver o humanismo e a inteligência coletiva.
Não resta dúvida que da mesma maneira que o livro causou todas as revoluções, criou condições de ideias novas circularem e a sociedade humana nunca mais foi a mesma.
Mas lembra-se também que os nazistas usaram a inteligência coletiva para o holocausto, que Hitler tinha uma vasta biblioteca e que a Europa com toda a sua literatice foi palco das maiores chacinas do século passado.
Cultura, livro não levaram ninguém ao Nirvana!
À luz.
Muita gente achou que o livro ia dar conta do recado, não deu!
O que acho interessante na frase do Saramago é justamente isso.
Ele não diz: a Internet não veio mudar o mundo.
Veio ajudar a adaptar o mundo a uma nova realidade de 7 bilhões de cabeças, digo eu.
Mas ele diz: a Internet não veio salvar o mundo.
E nisso eu concordo inteiramente com ele.
Ela possibilita mudanças, mas não salvá-lo.
E filosoficamente estou na linha de Arnold Toynbee que acreditava no final de sua vida de historiador, depois de conhecer diversas civilizações do passado, que a tentativa de mudança da sociedade só passaria pela mudança do próprio ser humano, no como ele faz as coisas e não necessariamente apenas no que ele faz, seja usando um livro ou um terminal de computador.
Um encontro entre a prática e a ética, emboladas, dialéticamente.
Nem uma, nem outra, mas as duas.
Os meios e os fins integrados.
Acrescentaria, enfim, que basicamente a mudança está na maneira que nos relacionamos com o nosso ego, no qual estão embutidos todos os condicionamentos sociais, aonde somos coisificados e ao invés de termos liberdade de escolha, repetimos padrões, achando que estamos inventando, quando, na verdade, rodando um programa interno na nossa cabecinha condicionada à procura das migalhas sociais de reconhecimento.
Ou como diz um pensador que gosto bastante:
Pensar pela própria cabeça implica o enfrentamento dos dogmas – Gustavo Bernardo – também da minha coleção de frases.
Conseguir enxergar isso de fora e caminhar na direção do encontro e das pessoas, é algo difícil, com ou sem Internet.
Fiz um pouco essa discussão aqui: “A Internet traz felicidade?”
É um bom ponto de discussão para todos nós que estamos engajados nessa luta atual pela difusão do que a rede traz de positivo para a sociedade.
Cuidado para não querer fazer dessa luta algo que alimente apenas o seu próprio ego!
Não vamos criar falsas ilusões.
A história nos mostra que o novo poder, seja ele qual for, se não houver uma mudança filosófica de como fazemos as coisas e olhamos as outras pessoas, trará os mesmos vícios dos anteriores.
É o que penso e neste aspecto estou fechado tanto com o Lévy como o Saramago: a Internet é uma estrada, mas quem coloca o carro nela sempre serão as pessoas, que terão que lutar internamente com os dogmas gravados na placa-mãe do ego para construir algo verdadeiramente novo e humano.
Para quem acha o papo esotérico e gosta de alguns fatos, sugiro a leitura do livro:
A Cientista que curou seu próprio cérebro.
Mostra que há dois lados claros na nossa cabeça e que um, o falante e condicionado, nos limita os sentidos.
Ela teve o derrame justamente naquele que fala…o que podemos chamar popularmente de ego.
Um papo longo, mas interessante.
E você o que diz ou vota?
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Nepô,
É uma variante do mito que a ciência salvará a humanidade.
Antes, os pré-iluministas talvez dissessem o mesmo sobre a Igreja/fé.
Abração
E tb com o livro.
Ficar atento é preciso!
abraços,
valeu o comentário,
Nepô.
Será que vale o ditado de que “a Virtude está no meio”?
Entre Saramago e Lévy, entre os sinais de fumaça ou os sons dos tambores e a web, entre a intransigência e a maleabilidade?
A Internet jamais salvará o mundo, pois o homem é quem deve usá-la como ferramenta, para a paz ou a guerra. Só o homem poderá “salvar” o mundo. Ou destruí-lo pelo efeito estufa ou por radiação de bombas nucleares.
Quem viver, verá.
Luiz Ramos
Luiz, concordo 100%.
Tks pela visita,
abraços,
N.