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Somos como um peixe que vive aprisionado num aquário; mesmo que o nosso “aquário” cresça sempre (pois é isso o que ocorre com o corpo do conhecimento humano), tal como o peixe, nunca poderemos sair dele e explorar a totalidade do que existe. Haverá sempre um “lado de fora”, além do que podemos explorar – Marcelo Gleiser – da coleção;

Hoje em dia o que mais escuto é o seguinte: não tenho tempo.

Vejo gente comprando livro compulsivamente e não lendo nada.

É como se quisesse o conhecimento, mas não soubesse como tê-lo.

Lembra aquele cara que paga a academia e não vai!

Ou compra roupa de ciclista e não pedala!

Ter o livro em casa ou mesmo colocá-lo debaixo do travesseiro não vai deixá-lo mais inteligente nem te deixar “por dentro das coisas”. 🙂

Tenho falado muito sobre nossa dificuldade afetiva-cognitiva para lidar com a explosão informacional que a rede digital trouxe para o mundo.

Nossa cabeça e afeto não foram criados para ter essa independência toda.

Somos infantilizados intelectualmente.

Não estamos maduros para termos liberdade e conseguir ler o que é preciso de forma consistente.

Essa questão atormenta, pois nos exige rever diversos processos na relação mais infantil com pais, escola, trabalho.

Algo muito marcado por imposições, por discursos fechados, por abuso intelectual, pela falta de espaço de desenvolvimento da capacidade crítica e de exposição da  individualidade de cada um.

Para poder lidar de forma diferente com essa massa de informação sem causar ansiedade, precisamos superar, digamos estes traumas.

Uma forma é trazer tudo isso para a consciência.

Entender, por exemplo,  como aprendemos, por que aprendemos e como mudamos nossa maneira de pensar de “A” para “B”.

E principalmente por que fazemos isso.

Diria que para superar esse obstáculo precisamos entender algumas etapas, tal como ter a consciência do aquário em que estamos.

Estamos dentro de um determinado aquário de conhecimento afetivo.

Aquilo que chamamos de “realidade” é algo que nos faz bem por um lado e mal por outro.

O aquário reúne as pessoas com as quais nos identificamos, nossa maneira de pensar e um conjunto de ideias que justificam para nós e para a sociedade a maneira que vivemos.

Só saímos desse ambiente confortável quando uma crise vem nos tirar da tranquilidade.

As crises podem ser pessoal, na família, no trabalho, na sociedade mais próxima (bairro/cidade), no país ou no mundo de maneira geral (como é o caso das mudanças que a Internet traz).

Quando isso ocorre precisamos olhar o aquário de fora, ver os conceitos, ideias, maneiras de pensar que nos atrapalham, repensá-lo, trocar de água e começar a nadar em um novo renovado.

Ou seja, quando vamos ler um livro ou entrar em contato com ideias novas, diferentes, devemos identificar que tipo de mudanças  o livro propõe e se vamos adotá-las na nossa vida de peixes.

Somos ao mesmo tempo que conservadores por natureza, (por uma questão de economia de energia e medo de mudanças), também curiosos.

É um paradoxo humano de todas as sociedades e tempos entre o não mudar e mudar, em inovar e manter.

Porém,  se existe algo que podemos fazer de forma melhor, pensando de nova maneira, gastando menos esforço, energia, tempo e dinheiro, por que não?

  • Assim, somos curiosos de maneira geral, como default, tendendo ao conservadorismo, fazendo mudanças muito bem pensadas em momentos de calmaria;

 

  • E altamente curiosos e carentes por novidades nos momentos de crise!

(Obviamente que os curiosos de plantão se antecipam as crises, pois estão sempre se renovando.)

Existem ainda, por temperamento, perfis distintos, uns mais inquietos do que outros, criando um movimento na sociedade entre inovação e conservação/ inovadores e conservadores, uma tensão que leva o mundo adiante, não ficando parado, mas mantendo-se em algumas bases para evitar que o aquário se parta, mas sempre se repensando.

Ler um livro, conversar com alguém, ver um filme, uma peça, qualquer que seja a atividade de contato com novas ideias, nos leva a olhar, de alguma forma, para fora da parede do aquário para a visão de outro peixe sobre ele mesmo.

Visto de fora.

Procuramos saber se existe algo útil naquele discurso (formado por novas teorias, premissas, conceitos)  para colocar em prática na nossa vida.

Quanto mais incomodados estamos, em crise, precisando mudar, mais vamos procurar autores/pensadores que nos permitam enxergar de fora, através de livros, ideias para repensar nossas vidas e mudar para uma nova, bem diferente.

A crise nos abre para o novo, pois percebemos que temos que mudar, não é mais algo opcional, mas uma necessidade premente.

E vice-versa, quanto mais acomodados estamos mais vamos procurar autores que nos confirmem que nossa vida é essa mesmo, que devemos continuar nesse caminho.

A continuidade nos fecha para o novo.

Obviamente, que isso não é racional ou previsível, pois não podemos prever o que há de aleatório na vida, pessoas que se acham conservadoras mudam radicalmente a partir de novas ideias ou em crises que não esperavam.

E pessoas que se acham mutantes, muitas vezes, são tão fingidamente mutantes, que não mudam nada em suas vidas, apesar de criar uma aura de fumaça em torno delas.

Tudo pode ser enganoso no discurso, por isso, gosto de olhar a prática.

Ao ter contato com novos autores, assim, você deve se perguntar, isso vale para você, família, bairro, condomínio, empresa, país, etc:

  • Qual é o meu momento?
  • Estou bem ou mal?
  • O que quero mudar?
  • Estou numa crise ou fora dela?
  • Sou mais conservador ou mais mutante?
  • O que procuro ao ler um livro, assistir a uma palestra?
  • O que esse pensador acrescenta para o meu aquário?
  • O que é útil para pensar mais tarde?
  • O que vou passar a adotar desde já?
  • E o que definitivamente não vou?

Qualquer pessoa que traga ideias novas está de alguma forma propondo mudanças para o mundo e para você.

Diz:

Está do jeito “A” precisamos fazer “X”, “Y”, “Z” para chegar no ponto “B”.

E podemos avaliar as ideias novas/velhas que estamos tendo contato da seguinte maneira:

  • Qual é a proposta do autor tal?
  • De onde para onde ele sugere que devemos ir?
  • Com que clareza ele defende seus argumentos?
  • Compreendi claramente o que  propõe?
  • Considero relevante para as mudanças que preciso fazer em minha vida/empresa/família/cidade/etc?
  • Como devo adotá-las?

Na verdade, conhecer/se informar/aprender passar por uma estratégia que será feita a partir das perguntas acima.

Num mundo muito mais mutante, em função das ideias circularem de forma mais descontrolada e dinâmica em um ambiente digital em rede, que chamo de líquido, nos obriga a ter outro tipo de estratégia, diferente da anterior.

Nossa taxa de conservadorismo e fechamento para o novo se era de 10 deve cair para um nível menor, pois quanto mais fechado você se coloca para um mundo que muda, menos estará preparado para ele.

Estamos mudando a taxa geral para um nível mais baixo de conservadorismo que o anterior.

A despeito disso é importante perceber que nem todas as ideias são relevantes para o seu momento e é preciso ter consciência de onde você está e para onde vai e quem pode te ajudar nessa jornada.

Que dizes?

 

 

3 Responses to “A consciência do aquário (como lidar com tanta informação?)”

  1. José Ricardo disse:

    Grande mestre, mais um ótimo texto. Parabéns.
    Aguardo mais textos com Dicas Matadoras, principalmente sobre Ansiedade da Informação.
    []’s

  2. Muito bom texto, excelente como sempre. Mas queria fazer o meu depoimento com relação a isso. Percebo sim, tudo isso acontecendo, mas são vários acontecimentos paralelos em mundos diferentesa, em momentos diferentes, por que imagino um sistema isolado, por exemplo: um ser qualquer. Este se encontra em um grau evolutivo diferente dos demais até por que o seu vizinho tbm passa pela mesma situação, mas com enfoques diferentes. Pra ser mais claro, seria como vários alunos na mesma classe, sendo um bom em matemática, mas ruim em português. Outro bom em química, mas ruim em física, e assim por diante. Depois precisamos analisar todas essas facetas do aquário, sabendo que existem muitas variáveis ontribuindo ou prejudicando o modus operandi de cada ser, por que cada um trás uma bagagem diferente, e que por isso possui determinadas abilidades e outros não; coisas da cognição. logo precisamos entender cada um em sua especificidade como ser e como elemento participe do ambiente (aquário). Tal como o velho ditado: o sol nasce para todos, mas cada um absorve de forma diferente. Estamos no mesmo barco, mas o que cada um vai pescar depende de muitos fatores.

  3. Nepo, excelentes colocações e reflexões!
    Há pouco tempo li um livro muito interessante sobre o tempo e o dinheiro e o autor dizia que todos nós quando nascemos recebemos 24 horas de um único dia. O que cada um de nós fará com essas 24 horas será determinante para os nossos destinos.
    De fato, os aquários são os destinos que escolhemos e a ansiedade vem por não sabermos aproveitar o tempo. Quando ele é bem aproveitado, produtivo, focado e prazeroso, tende a passar no seu tempo e não rápido demais como muitos têm sentido nesses tempos de alta tensão na comunicação. bj

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