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Quem discute alegando autoridade não usa a inteligência, mas a memória. Leonardo da Vincida coleção;

A Ciência veio ao mundo para trazer clareza.

Ou melhor, reduzir o que é turvo.

Se aproximar ao máximo dos fatos, retirando as subjetivas versões, mesmo que sejam várias e diferentes.

Quanto menos dialoga com a sociedade, mais se afasta do seu papel e vice-versa.

Criou-se, então, nesse processo métodos de validação, entre em fatos (fenômeno) e versões (percepção).

Os fatos são representados, através de medições (instrumentos e pesquisas) para se criar percepções sobre a “realidade” (sempre intocável), registradas em documentos.

Ou seja:

O fenômeno  –> a medição –> a percepção  –> registro (via documento) –>intocável verdade;

(Abordei o tema por aqui com o  post que fiz do termômetro).

Todas as conclusões sobre essa “procura da clareza impossível” é depositada em documentos, que são o resultado de toda Ciência, que troca, troca, troca, mas tudo acaba num bom texto escrito, publicado em algum lugar.

Com pequenas variações em vídeo e áudio.

Depois, o que vira produto ou serviço, fora ou dentro da academia, é resultado do que foi primeiro representado em um documento.

Os documentos, portanto, são o resultado de um processo de observação de um fenômeno, que é medido e depois percebido, através de uma versão, tanto do fato, quanto da medição deste.

Não é a realidade, mas o mais que alguém consegue chegar nela.

Não significa que mais documentos vão nos levar a mais clareza, pelo contrário, quanto maior o volume, mais temos problemas para administrar essa clareza.

(O ideal seria produzir o máximo com o mínimo de documentos (a beleza científica), diferente do que sugere a Capes, que incentiva publicar ao máximo, sem aferir, muitas vezes, a qualidade do que é produzido, trazendo mais escuridão do que luz.)

Existe um outro vetor nessa história de tentar reduzir a escuridão do real, que são os modelos mentais.

As percepções não aparecem do nada, existem escolas, pensadores, que conseguem, por sua clareza, posição, força, carisma, acertos, sabe-se lá, criar escolas, que vou chamar de modelos mentais, mas pode-se chamar de paradigmas, ideologias, etc, a gosto:

O fenômeno  –> modelos mentais –>  a medição –> a percepção  –> registro (via documento) –> Intocável verdade;

Quando um determinado autor pertence ou abraça uma escola de pensamento (sou nãoseioquelániano), reproduz um dado modelo mental que vai influenciar na  medição e, por sua vez, a percepção do fenômeno e, por consequência, nos documentos produzidos.

(Os modelos mentais são incorporados em disciplinas, que se constituir em um outro vetor, mas que não vou aprofundar agora, mas existe e forte.)

Por fim, para cumprir seu papel na sociedade,  a Ciência define critérios que serão disseminados.

Tais “verdades” nos ajudam a atuar na vida, resolver problemas e crises, influenciando as ações que teremos na nossa vida cotidiana.

O que é o caminho final de todo um processo, que quanto mais deturpado for, mais crises (e sofrimentos) trará para a sociedade, pois se usará um caminho esburacado.

A prática da Ciência, seu processo, pode ser assim vista sob a ótica destes filtros, ou variantes destes.

Quem quer saber da realidade que nos cerca, deve compreender o papel que esse exercíco, tem sobre a sociedade, pois é a Ciência, em última instância, que define critérios da verdade, com maior ou menor influência social.

A ciência, como tudo na vida,  se organiza por ciclos. Momentos de equilíbrios e desequilíbrios que podem ser quebrados por fatores desequilibrantes.

Situações que uma dada percepção da realidade é abalada:

Mudanças no fenômeno – caso típico da Internet, um fato novo que faz rever todos os conceitos sobre informação/comunicação/sociedade, ou um vulcão que entra em erupção depois de séculos, ou uma pandemia inesperada, ou mudanças no clima, como as recentes enchentes na Serra do Rio;

Mudanças na medição– novos microscópios, telescópios, aparelhos que sequenciam genomas, máquinas de tomografia que desvenda o cérebro e nos permite enxergar o que não tínhamos instrumentos;

Mudanças em modelos mentais – impulsionados pelos motivos anteriores, ou a chegada de um novo grupo, ou uma pessoa, que consegue ver diante dos que foi levantado no passado de outra maneira, como Einstein;

Mudanças na forma de se produzir documento – em função de um novo ambiente informacional (como assistimos) que faz com que a maneira de se produzir, validar, divulgar seja diferente, alterando o “modus-operandi” da própria Ciência e afetando a medição e modelos mentais, no caso da rede digital, abrindo e ampliando mais o debate, com mais velocidade;

Tais mudanças são chamadas, segundo Kuhn, de Crises de paradigmas, que são o resultado de algum desequilíbrio que denotam que antigas verdades, não conseguem mais dar respostas efetivas e satisfatórias para novos problemas.

E tudo nos leva à mudança de percepção, criando novos modelos mentais.

A Internet, por exemplo, é uma mudança no fenômeno informacional/comunicacional,  que nos faz rever um conjunto de modelos mentais pelos quais víamos a sociedade, pois passamos a ver que a informação/comunicação tem um peso muito maior que imaginávamos e ela é mutante e não parada como supúnhamos, alterando radicalmente nossa percepção.

A Internet aprofunda o que chamo na minha tese de doutorado de Macrocrise de informação, que é basicamente uma quebra de paradigma na relação sociedade/informação/comunicação/demografia que precisa ser repensada.

Bom, feita essa base,  abordarei mais o tema no blog, com a rúbrica Ciência 2.0.

Até aqui, o que dizes?

15 Responses to “Ciência 2.0: a busca do eterno (des) equilíbrio”

  1. Carlos Nepomuceno disse:

    Recomendo a leitura deste artigo:
    Strategic Reading, Ontologies, and the Future of Scientific Publishing
    http://www.sciencemag.org/content/325/5942/828.full

    Destaco (tradução do tabelião abalizado Dr.Google) 😉

    A força motriz para a mudança continua a mesma: a quantidade e complexidade crescente das informações, em combinação com tempo limitado para a leitura.

    (…)

    Assim como o aumento da quantidade de informações e de intensidade geral da atividade científica está chegando ao ponto em que não pode ser sustentada com as práticas atuais

    (…)

    uma mudança cultural na nossa abordagem à informação é necessária

    (…)
    Os cientistas sempre se esforçaram para evitar a leitura desnecessária. Como todos os pesquisadores, eles usam indexação e citações como indicadores de relevância, resumos e revisões de literatura como substitutos para artigos completos e redes sociais, dos colegas e alunos de pós-graduação como pessoal de alerta. O objetivo é mover-se rapidamente através da literatura para avaliar e explorar o conteúdo com a leitura real possível. Como a indexação, recomendando, ea navegação se tornou mais sofisticado no ambiente online, essas práticas de leitura estratégica têm se intensificado.

  2. Carlos Nepomuceno disse:

    Outro artigo interessante, que aborda, de forma indireta, o que estamos conversando é o UM MODELO SEMÂNTICO DE PUBLICAÇÕES ELETRÔNICAS, Marcondes, em http://congresso.ibict.br/index.php/enancib/xienancib/paper/view/373:

    Destaco o nome que o pesquisado atribui à pesquisas que visam mudança de modelos mentais, citados no post acima:

    Artigos teórico-abdutivos – se caracterizam por discutirem questões de maior abrangência. Analisam criticamente diversas hipóteses anteriores, mostrando suas fragilidades. Estes artigos são os que têm mais potencial de apresentarem contribuições para a Ciência, já que discutem ou questionam o par adigma vigente (KUHN, 2003). Sua contribuição é uma nova hipótese, indicando um novo caminho de pesquisa. O tipo de raciocínio empregado é o abdutivo (MAGNANI, 2001) ou seja, o “insight” sobre a solução de questões não explicadas na Ciência e a formulação de novas hipóteses de solucioná-las.

    (…)

    Quando aborda questões de “Medição” temos artigos:

    Artigos experimentais-dedutivos – trabalham a partir de relações entre fenômenos já formuladas anteriormente, cujas referências vêem citadas, aplicando-as a testando-as e
    validando-as um contexto específico. Os artigos
    experimentais-indutivos se caracterizam por proporem e testarem novas relações entre fenômenos.

    (…)

    Artigos experimentais – constam necessariamente de um experimento empírico. Se dividem em exploratórios, dedutivos e indutivos. Se caracterizam por discutirem questões num escopo de abrangência limitado. Não discutem os rumos de uma teoria científica, mas se limitam a confirmá-la ou aperfeiçoá-la. Sempre trazem resultados experimentais.

    (…)

    Artigos experimentais-exploratórios – tem um caráter exploratório (LAURA, 2004) ao desvendar e buscar caracterizar um fenômeno, trabalhando na direção proposta por Dahlberg (1995) de formular e provar proposições que caracterizam um fenômeno.

  3. Alessandra disse:

    Alô, Nepô! Concordo plenamente que a Internet traz uma crise paradigmática (Kuhn) para a ciência da informação, para a comunicação e várias outras áreas. Escrevi sobre isso, comentando justamente um artigo seu. E as crises paradigmáticas trazem evolução para a ciência.
    Sobre a tal da “verdade científica” Deixo aqui umas palavrinhas do Mario Bunge (filósofo da ciência):
    “O conhecimento científico é como organismos em crescimento: enquanto estão vivos, mudam sem cessar”. E nós? Temos que estar abertos a mudanças pois, afinal, somos nós, os tais organismos vivos, certo? 😉
    Abraço!!!

  4. Thiago Mouço disse:

    Fala Nepô, td bom?
    Achei muito interessante essa sua colocação, mas fiquei uma dúvida: você com isso quis dizer que a ciência é moldada de acordo com os modelos mentais, que se aprimoram ao longo do tempo, diante das mudanças que acontecem e também diante de fenômenos como a internet, que nos faz repensar antigos conceitos. Em contrapartida, esse modelos mentais são baseados em um tipo de escola, de ensino e que quando é registrado, passa a valer. E também esse registro e esses modelos mentais influenciam na medição (que é o instrumento de estudo do homem para encontrar a “verdade” sobre um assunto). Sendo assim, podemos dizer que os estudos científicos formam-se através de linhas de pensamento, que se conduzem de modo a buscar “verdade” (que é inalcançável). E isso implica em dizer que se lá atrás, um cientista, que fosse adepto de uma outra linha de pensamento ou outra filosofia, tivesse estudado, medido e documentado uma pesquisa e outros estudos fossem feitos em cima do que ele apontou, hoje talvez teríamos uma outra verdade sobre essa pesquisa? Não será que independente do caminho, seja ele qual for, não caminhamos para uma mesma verdade? Isso põe em questão o que aprendemos e fazemos hoje em dia. Será que é o mais correto? E é aí que entra a zona de conforto e é preciso um cara alheio a tudo isso ou incomodado com tudo chegar e querer mudar completamente. E a partir dai medir e documentar e dar um novo caminho, que será escrito de acordo com seu modelo mental. O pensamento sobre isso está correto?
    Abcs

  5. Carlos Nepomuceno disse:

    Alessandra, fechadíssimo!

  6. Carlos Nepomuceno disse:

    Thiago,

    acredito que falta algo importante: os problemas humanos e seus equilíbrios. A Ciência, assim como todas os pensamentos humanos vêm na direção de solução de problemas que nos incomodam.

    Já parou para pensar que não paramos para pensar em coisas que não nos incomodam no momento?

    Ou seja, a Ciência vai responder aos desafios de um tempo:
    doenças, desastres, fenômenos, sofrimentos, etc..

    E as atenções vão se voltar para esse tipo de questão com diversas respostas, até que algumas vão ser aplicadas, minimizar, equilibrar a coisa e vamos em frente.

    A ciência, assim, não seria feita de problemas abstratos sem referência nenhuma.

    Hoje, em função da falta de controle social sobre ela isso tem acontecido com mais frequência, com estudos aprofundados sobre falsos-problemas que nos levam do nada a lugar nenhum.

    Portanto, a coisa é um equilíbrio e desequilíbrio.

    Assim, no que você diz:

    “hoje talvez teríamos uma outra verdade sobre essa pesquisa?”

    Se essa verdade provisória resolve de uma forma melhor com uma velha visão um atual problema, sim, tem chance de voltar.

    Espero que tenha ajudado, sua pergunta me forçou a pensar melhor, agradeço visita e comentário, tanto o seu como da Ale.

  7. Alessandra disse:

    Nepô, Thiago, juro que não é preguiça mental pra escrever, é falta de tempo mesmo… Por isso vou copiar e colar um trecho do Marcelo Gleiser que postei há pouco tempo no meu blog (meio abaronado pela tal falta de tempo):
    “O primeiro passo é admitir que a ciência tem limites, que a sua prática e os cientistas que a praticam têm limites. A ciência tem que ser humanizada, relacionada com a cultura em que existe. Precisamos confessar nossa surpresa ao nos depararmos com um Universo aparentemente cada vez mais misterioso; precisamos ser mais humildes ao declarar o quanto sabemos sobre o mundo, não nos esquecendo do quanto não sabemos”. Está lá em http://cienciadoispontozero.com/2011/01/30/humildade-cientifica/
    Quero mostrar com isso que o verdadeiro cientista tem absoluta consciência de que as “verdades científicas” são provisórias.
    E sobre os modelos mentais que o pesquisador usa ao conduzir uma pesquisa (que culmina na publicação de um artigo) escrevo outra hora, porque o tema é longo, mas alguns autores reconhecem que estes modelos mentais influenciam na pesquisa. E influenciam! Aí, o que está em questão, é a tal da “neutralidade científica”… É possível? Isso existe? Em último caso, como pesquisadores, temos que tentar, mas acredito que não é tão simples assim… 🙂 O livro do Marcelo Gleiser que citei, mostra a virada que esse físico deu em tudo o que acreditava.
    Abraços!!!!

  8. Carlos Nepomuceno disse:

    Alessandra, adoro o Gleiser, bem lembrado!

  9. Júlia Linhares disse:

    OI, Nepô,
    olhando para trás é possível perceber que crises de paradigmas aparecem de forma ciclica ao longo do tempo, e acredito que o desequilibrio total, o caos, é fundamental para a inovação de pensamentos, modelos mentais e mudanças culturais. Hoje em dia, nós sofremos com a quantidade absurda de informação a que somos expostos. Absorvemos mal e porcamente o que nos é interessante e deletamos o resto do “nosso processador”. Existe uma sede por saber cada vez mais e acredito que este seja um dos motivos pela criação descoordenada de conteúdo e informação na internet. Mas como disse em cima, acho que o caos, a confusão é necessária para o próximo passo, a revolução de como a informação deve ser exposta e armazenada.
    Ainda não sei como será os próximos passos, mas confesso que a aula de ontem me fez pensar bastante e curiosa para saber e repensar os meus paradigmas!
    Beijos, Júlia Linhares

  10. Carlos Nepomuceno disse:

    Julia, muito bom…resolver esse caos informacional tem exigido um esforço grande geral, mas acredito muito em se concentrar no fundamental e deixar o supérfluo…
    nos vemos depois do carnaval, brinca na sombra, 😉
    abraços, Nepô.

  11. Nepo,

    Vejo na idéia de mudança mudanças no fenômeno/medição/modelos mentais/produção um conceito tão forte quanto a idéia das tecnologias cognitivas e não cognitivas. Interessante também refletir sobre as causas das mudanças no fenômeno.

    Não vejo uma lógica tão sequencial nas coisas, até que ponto conseguimos identificar o que mudou mais, se foi o fenômeno ou se foram as novas formas de medir que mostraram que ele parece ser diferente do que se pensava anteriormente, um suposto dilema de tostines.

    Abs,

    Luiz.

  12. Carlos Nepomuceno disse:

    Luiz,

    vc diz:

    “Não vejo uma lógica tão sequencial nas coisas, até que ponto conseguimos identificar o que mudou mais, se foi o fenômeno ou se foram as novas formas de medir que mostraram que ele parece ser diferente do que se pensava anteriormente, um suposto dilema de tostines.”

    Todo o modelo, seja qual for de análise, trabalha com extremos para problematizar e facilitar a identificação e o uso do modelo é justamente saber ter um “Tostines jeito de aplicar”.

    Porém, há momentos em que claramente existem fenômenos, forças da natureza ou ações humanas que provocam alterações na “realidade” que nos obrigam parar para pensar, tais como: Uma pandemia, um vulcão inativo que volta, a Internet (provocada por forças coletivas e inconscientes de seu papel global), um cidadão que tem uma capacidade diferente de todos os outros, etc…

    São fenômenos “novos” que obrigam a um repensar, poderia até chamar de “fenômenos paradigmáticos”.

    Menos Tostines?

  13. Thiago Mouço disse:

    Ajudou sim Nepô. O seu post é que foi instigante e desafiador também. Em determinado momento, pensando nesse processo como um todo, naveguei em infinitas ideias que se relacionam e ficam até difícil de relacionar e explicar.
    E Alessandra, ótima citação do Glaiser. Vou dar uma navegada lá no sue blog nesse final de semana.

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