Na maioria das empresas, a maneira de controlar as pessoas se dá por meio de rigorosas descrições de cargo, de uma rede de processos e protocolos, de fortes relações de supervisão e hierarquia. É um modelo organizacional quase idêntico ao que foi aplicado na construção das pirâmides do Egito, totalmente fora de sintonia com a sociedade, que tende à tribo, ao networking – Gary Hamel – da coleção;
Versão 1.7 – 14/11/2011 – Rascunho – ajude na revisão.
(Texto faz parte do meu novo e-book – Gestão da Desintermediação – uma obra em progresso. Inspirado pelos debates que tive com a turma MBKM 23)
A grande novidade que a Internet traz para o mundo não é a tecnologia digital em rede como muita gente tem apregoado.
O mais impactante é tudo aquilo que esta tecnologia cognitiva desintermediadora propicia e determina: uma nova cultura de controle (que podemos chamar de controle digital) de forma global, que determina inapelavelmente uma nova forma mais dinâmica e eficaz de resolver problemas e de exercer controle sobre pessoas, ideias e processos.
Uma revolução cognitiva como a que estamos vivendo é um fato muito incomum e raro na história da civilização. Conseguimos identificar uma revolução cognitiva como essa com a chegada da fala e da escrita.
Estamos aprendendo, assim, que tal mudança de cultura é um dos fenômenos sociais mais impactantes que temos notícia e está começando a moldar a sociedade daqui por diante, fundando uma nova civilização ao longo do tempo.
Por quê?
Novos personagens passam a fazer uso dessa nova maneira de resolver problemas, através de novas ferramentas e metodologias, surgindo novos projetos empreendedores, novos talentos e líderes.
Ou seja, irá se tornar cada vez mais vital adotar esse nova cultura nas organizações, mesmo aquelas que consideram que nunca serão atingidas por ela.
Não se trata, portanto, de uma nova metodologia de gestão, mas uma nova forma de fazer o controle dos processos, pessoas e ideias, que é, digamos, o sistema operacional por baixo de qualquer gestão.
Tal fato, nos levará a uma tensão constante entre as duas culturas, a analógica (que não quer ir) e a digital (que insiste em chegar).
Será essa tensão entre as duas culturas dialogando e muitas vezes brigando o fator principal dos conflitos sociais (dentro e fora das organizações) ainda sem explicação pelas atuais teorias de plantão.
Alinho abaixo algumas constatações sobre essa passagem que estamos assistindo da cultura de controle vertical analógica dos ambientes sociais para os controlados de forma mais horizontal e digital:
1) Toda sociedade tem uma cultura de controle invisível, que faz parte da maneira com que a aceita e consegue funcionar, algo construído e negociado ao longo do tempo, sempre com uma certa tensão entre as diferentes forças mais ou menos conservadoras;
2) É algo aceito e incorporado no mais íntimo do nosso ser, da qual não temos muita consciência, quase como o ar que respiramos, pois é a base da educação do berço à escola;
3) Esta cultura de controle, de maneira geral, estabelece, ao longo do tempo, as regras tangíveis e intangíveis para gerir/administrar pessoas, processos (principalmente produtivos) e ideias em toda a sociedade;
4) Tal cultura envolve ainda, principalmente, o modelo de gestão das organizações, uma espécie de sistema operacional da placa-mãe que forma nosso modus-operandi, do qual acionamos para resolver qualquer tipo de problema;
5) Essa cultura de controle pode mudar ocasionalmente e/ou regionalmente/ ou em uma dada organização, a partir de revoluções ou revoltas sociais, ou ainda através de novos modelos de gestão, passando, por exemplo, de uma mais para menos hierárquica;
6) Porém, uma cultura de controle só muda globalmente, ao mesmo tempo, em vários lugares, a partir da chegada de uma nova tecnologia cognitiva desintermediadora, que podemos chamar de revolução cognitiva;
7) Tivemos uma revolução como essa com a chegada da fala e da escrita. Em particular, mais perto, com a expansão e massificação da escrita (escrita 2.), a partir do papel impresso, em 1450. Ou como agora com a expansão da Internet, através de “redes sociais digitais”, desde 2000, quando a banda larga barateou os custos de acesso;
-8) Uma nova cultura de controle começa, assim, com a chegada de uma nova tecnologia cognitiva desintermediadora, que logo dá margem a projetos pilotos de visionários, encarados inicialmente pela sociedade como curiosos e circunscritos a alguns setores (como o da informação/entretenimento), mas que vão ganhando cada vez mais espaço;
9) Uma cultura de controle, portanto, só é alterado de forma global, quando massificamos uma tecnologia cognitiva desintermediadora, inaugurando uma nova etapa civilizacional, a partir desse fato, impulsionada por espaço intenso de nova de ideias;
10) Além disso, atinge diretamente a forma como estabelecemos o exercício do poder social em todas as instâncias, que é algo arraigado em cada um e no modelo de gestão das organizações, uma mudança profunda e de um grau de superação muito grande;
11) É comum e natural, assim, que haja uma enorme dificuldade de compreensão do fenômeno, da aceitação de sua inevitabilidade, e, quando ocorre essa percepção que veio para ficar, de aceitação e adaptação à nova cultura do controle, pois não sabemos por onde começar;
12) Já está havendo (e haverá muito mais) resistência nos setores mais conservadores, aqueles que mais se beneficiam do antigo modelo (tal como a área financeira/ditaduras). São organizações/países menos competitivos e mais verticalizados e que se beneficiam da sombra que um modelo mais centralizado de ideias permite durante um longo período;
13) Podemos dizer que esse longo período de controle rígido de ideias aumentou a taxa de ganância na sociedade, reduzindo o espaço para ideias e princípios de maneira geral e o surgimento de líderes mais conectados com os desejos da maioria. São taxas de ganância que estão elevadas, pela falta de mediação e espaço de uma fiscalização mais efetiva, que passa agora a ser possível pelos novos canais, que tendem a baixar essa taxa de ganância;
14) A chegada de uma nova cultura de controle tem como causa principal a necessidade de dar novas respostas inovadoras ao aumento radical da população (lembrando que saltamos de 1 bi em 1800 para 7 bi em 2010, com um crescimento atual de mais 1 bi a cada 10 anos);
15) Uma nova cultura de controle é, portanto, uma ferramenta humana fundamental para lidar de forma mais dinâmica com os antigos e novos problemas gerados por um número maior de habitantes;
16) Tal aumento, pressiona os processos de produção e, por sua vez, de inovação, de comunicação, informação e conhecimento, justificando cada vez mais a adoção da nova cultura de controle;
17) Essa nova cultura do controle se caracteriza pela passagem de um controle baseado em intermediadores humanos (jornalista, médicos, gatekeepers, professores, corretores de todos os tipos) para outro baseado em profissionais que já operam com um novo tipo de desintermediação;
18) Os novos profissionais desintermediadores vão ter como parceiros de trabalho robôs, algoritmos, geolocalizadores, chips nos objetos e comunidades em rede articuladas digitalmente, que já são e serão ainda mais capazes de controlar um volume muito maior de informação/processos/operações em menos tempo com mais relevância, geração de significado e eficácia;
19) A mudança da cultura de controle afeta, de forma profunda, a subjetividade de cada indivíduo e a relação deste com seu ego, da relação de poder, o que é algo aprendido desde nossa família, passando pela escola e convívio social;
20) Adaptar-se, assim, à nova cultura exige prática e reflexão, pois não é uma mudança teórica, mas na prática de pensar e solucionar problemas, não sendo algo que podemos falar sobrem, mas falar, agir, pensar, repensar e falar e pensar de novo;
21) Mudanças desse porte podem ser comparadas, grosso modo, a efeitos modificadores globais da vida social, tal como grandes pandemias ou a queda de um grande meteoro ou ainda a modificação brusca (ambas com grandes perdas populacional) e repentina do clima a nível global, com impactos efetivos e irreversíveis para os próximos séculos;
22) A mudança da cultura de controle não está ainda bem detalhada nas nossas teorias sociais, nem nos manuais de construção de cenários futuros das organizações, o que dificulta ainda mais a criação de estratégias eficazes de gerenciamento do fenômeno;
23) Hoje, analisamos o futuro baseado em fatores variantes na economia (com mais ênfase) e na política (com menos), mas não incluímos mudanças nos ambientes cognitivos, da informação e da comunicação;
24). Tal fato é ainda agravado ainda mais por um mundo muito ligado ao presente e com tendência a-histórica, características aliás do esgotamento de uma cultura de controle que durou várias décadas;
25) Por causa disso, a tentativa de fazer projetos pilotos nas organizações e na sociedade, sem a devida preparação de mudança da cultura de controle, não tem funcionado a contento. Ao se tentar implantar tecnologias digitais em rede, indutoras naturais dessa mudança para a nova cultura, tais projetos acabam por esbarrar na cultura passada e criam crises de culturas distintas no mesmo ambiente, mal gerenciadas pela falta de consciência do que de fato está mudando (ver mais sobre métodos de implantação de redes sociais corporativas aqui);
26) Estamos aprendendo, portanto, que não é possível, em um mesmo ambiente gerencial a convivência, de forma harmônica, das duas culturas de controle, pois são antagônicas e incompatíveis entre si, o que dificulta ainda mais essa adaptação e implantação, sendo necessário a criação de grupos internos que possam compreender com profundidade o fenômeno para criar estratégias inteligentes de implantação da nova cultura;
27) Assim, a migração das organizações para a nova cultura de controle deveria passar, se formos pensar na forma ideal, por um processo racional e estratégico com os seguintes passos:
a) percepção e difusão da inevitabilidade da mudança, sua dimensão, extensão e impacto;
b) formação de grupo que possa compreender e se aprofundar continuamente na extensão da mudança;
c) inclusão, como apoio desse grupo, de projetos estratégicos de passagem de toda a organização, através de um plano de mudança, pela ordem, de mentalidades, pessoas, tecnologias, metodologias e incorporação de novos perfis profissionais, tendo novos paradigmas de métrica para avaliar os projetos, tendo como parâmetro a geração de valor;
d) a introdução da nova cultura em áreas independentes, quando possível, ou na criação de um novo ambiente de trabalho completamente isolado da cultura antiga, que permita adotar de forma integral a nova cultura, com as novas tecnologias e metodologias de controle, substituindo a passada. O estudo de startups é recomendável, quando possível, como fez, por exemplo, a Americanas.com, saindo completamente dos braços da Lojas Americanas;
28) Portanto, as organizações que desejarem fazer essa migração terão que procurar espaços, seja em setores que possam ter uma certa independência produtivo/gerencial (o que é muito raro) ou na criação de startups, completamente moldadas dentro da nova cultura de controle, que servirá de base para, ao longo do tempo, ocupar o lugar da antiga cultura organizacional mais controlada e obsoleta;
29) Não se pode prever o tempo que essa nova cultura se tornará hegemônica, pois depende um conjunto enorme de fatores imprevisíveis, que lutam entre si no atual momento, mas que o processo deve ser mais rápido nos lugares em que há mais competição e menos proteção a grupos monopolizados;
30) Pode-se dizer, entretanto, que a chegada da nova cultura de controle já está disseminada entre os mais jovens, que já se utilizam dessas ferramentas de forma natural, antes dos adultos, (um fato completamente novo na histórias das tecnologias cognitivas), sendo eles um fator indutor e acelerador das mudança, já surgindo aí uma tensão latente entre as duas gerações, representantes das duas culturas que lutam pelo espaço na sociedade;
31) Assim, a chegada de uma nova cultura de controle tende a oxigenar a sociedade de novas ideias, projetos, processo e talentos, através do questionamento de antigos valores e conceitos, em um processo de resgate de princípios, que visa abrir novos canais de comunicação e diálogo na sociedade (pode se observar essa tendência no discurso de vários pensadores, com termos tais como “Liderança Aberta”, “Presença”, “Capitalismo Social”, etc);
32) por fim, a nova cultura de controle digital poderá ser considerada hegemônica quando novas leis sociais forem estabelecidas, através a representação política e modelo econômico, que expresse essa nova cultura. No passado, para se chegar a esse ponto de ruptura e passagem final foi preciso revoluções sociais (tais como a Francesa e a Americana), que levaram 250 anos para ocorrem, a partir da Revolução Cognitiva. Isso se repetirá? De forma radical? Em quanto tempo?
Que dizes e o que acrescentas?
Via historia, via sociologia, o homem sempre passa por tais confrontos. Vejamos – escravo vs senhor, patrão vs empregado… Professor vs aluno, escola vs professor, os meandros para se fugir, escapar, contornar sempre se dão para alguns… Tudo depende da visão, da ótica , que nao seja uma ilusão. Triste Ne, a historia se repete pq nao temos memória, ou aumentamos a memória mas repetimos tudo, … Nao sei..
Olá, Nepô,
Vi ontem no cinema O Preço do Amanhã e lendo seu texto o relacionei com a desintermediação e a queda da cultura de controle. Quando resolve doar tempo às pessoas o protagonista destrói o império que controla a vida de todos. Se puder, veja o filme.
Abraços,
Tereza, isso mesmo….Angela, legal, grato pela dica….vou ver e te digo… beijos.
Vivenciei isso há uns 15 minutos. No caso, uma amiga reclamava que uma pessoa, bem articulada na rede, informou sobre um evento de sua assessorada antes de ela preparar e organizar um release.
Eu dizia a ela, em linhas gerais, que isso é a força das redes sociais… cada um tem sua audiência, não dependendo mais de uma assessoria… claro que algumas coisas podem ser melhor articuladas para serem melhor organizadas, disseminadas. Aí entra a reflexão para uma nova gestão, creio.
Marcos, e eu creio do mesmo jeito 😉
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