Todo ser humano precisa sobreviver.
Para isso, é necessário comer, beber, se vestir e ter um teto, como condição mínima para estar no mundo.
Qualquer sociedade, então, terá que produzir estas condições para seus cidadãos/cidadãs e todo o cidadão/cidadã deverá exercer alguma função – ou alguém exercerá para ele – para que possa satisfazer necessidades básicas.
Sobreviver é condição básica de quem saiu chorando da barriga da mamãe – aquele lugar quietinho e quente, mas que não tem volta. 😉
O trabalho deve, assim, gerar renda/produtos/serviços suficiente para que qualquer pessoa possa viver dele.
Isso vale para quem nasce na tribo mais primitiva ou na sociedade mais sofisticada na face da terra.
Ralar est.
Por outro lado, as pessoas têm as suas subjetividades, dons, talentos e gostariam que pudessem trabalhar ou exercer a sua sobrevivência, utilizando esses potenciais inatos, muitas vezes, únicos.
E aí temos a tensão permanente, eterna entre o ser (nosso potencial) e o sobreviver (conseguir transformar potencial em potência remunerada).
Um equilíbrio dinâmico que a maioria procura entre o espaço para trabalhar que lhe dê a sobrevivência utilizando, ao máximo, dos seus dons possíveis.
(Além de todas as outras atividades que compõem o ser: amigos, família, filhos, espiritualidade, etc…)
As alternativas entre o ser e o sobreviver são várias, já vimos em vários filmes, romances, novelas, mas vamos a algumas delas:
a) não trabalha – como eram os filósofos gregos, com seus escravos, ou os filhos de nobres, ou de ricos hoje em dia, os párias sociais;
b) só sobrevive – que é uma característica das tarefas repetitivas, o que Marx chamou de tarefas alienantes, geralmente braçais, que as pessoas fazem e geralmente ficam pensando em outra vida. São salários baixos, mora-se longe e não há tempo para se construir projetos do Ser (Brasil na veia);
c) sobrevive e acha que coloca o dom em algo que faz algo depois do expediente – o trabalho não é tão alientante, ou braçal, vai se levando e se acha espaço depois do expediente para algo. Sonho, em parte, acalentado pelos milhares de jovens que tentam o concurso público;
d) sobrevive e acha que coloca o dom no que faz – tarefa mais difícil, pois se achar, ou ir achando, esse “lugar mágico” é difícil, mas tem gente que consegue, pois existem trabalhos mais criativos que suprem esse potencial criador.
A questão central que rola nessa tensão ser/sobreviver é que o sobreviver faz parte da vida é algo que nos vai levando meio sem pensar, no piloto automático, a partir de pouca reflexão, no qual muitas vezes não conseguimos colocar nosso afeto naquilo que fazemos.
Cabeça para um lado, coração para outro.
No mundo 1.0, uma de suas principais crises, é justamente essa alienação entre o ser e o sobreviver, muitas tarefas repetitivas.
Tal alienação que coisifica as pessoas nas empresas que, por sua vez, cosifica a relação com os clientes, que são coisificados.
Um bololô de abusos.
Tudo na vida nos leva para o não-ser (ou para o ser menos) ou para apenas sobreviver, conforme o outro nos determina.
O velho: “Vai por mim….”
Ou melhor, tudo facilita para que você não cavuque dentro de você e procure espaços para você viver os seus potenciais, seja individualmente, ou como outros em processo de descoberta como o seu, empobrecendo, assim, a sociedade de novos talentos, visões, percepções e ações.
E aí mora o problema, pois a única pessoa que realmente pode saber o que vai dentro de você é você mesmo.
Ninguém sabe exatamente se você está sendo e exercendo seu potencial, só você!!!
Geralmente, não há cobrança.
Ou seja, quem tem um óculos interno é você.
E aí é difícil de saber Quais são meus dons? Potencial?
Os indianos têm uma palavra para isso que é o Dharma.
Diferente do Karma, o Dharma representa atividades que você têm mais facilidade do que a maioria para executar e, por isso, dão mais prazer.
Teoriamente, para um equilíbrio sistêmico quanto mais você exercer essa função, mais harmonia levaria para o mundo e, por consequência, para você mesmo.
Viagens?
Acrescentaria ainda, num mundo das inovações e mutante que estamos entrando, devido ao aumento da população e – por consequência – o surgimento da rede digital, será preciso ampliar o espaço do ser, do envolvimento.
Envolvimento em as atividades nas quais você tem curiosidade de estudar e, portanto, se envolve afetivamente.
Se você não tem prazer em fazer, estudar e saber cada vez mais sobre a sua área de atividade, sua taxa de Dharma está baixa.
E aí caminhamos para as taxas.
O ser e o sobreviver são taxas que teremos flutuações delas ao longo da vida.
Equilíbrio e desequilíbros dinâmicos, conforme idade, situação, filhos, etc…
Tem épocas que você terá ela mais alta ou baixa.
A busca, portanto, não é resolver o problema agora e pronto, pois é um movimento, um processo, como todo o resto na vida.
Essa contínua tensão nos leva a tentar sempre elevar a taxa para que possamos ser o máximo possível do que podemos.
Estou sendo (exercendo meus dons) mais agora do que fiz antes.
E isso é uma batalha individual, instransferível (apesar de ser bom ter parceiros na jornada) e que tem como base o auto-conhecimento e da escuta interna para que você possa seguir aquilo que você considera compatível com seu Dharma.
(Teremos ainda o ingrediente da rede e do coletivo nisso e ainda da influência do poder do cliente 2.0, querendo menos abuso e forçando as empresas ao diálogo, ao afeto e, por sua vez, ao ser – a se abordar depois)
Por fim, essa busca não é no vazio.
Existe um barco, uma vela e o vento.
O vento é o ambiente, o mercado, as necessidades que aparecem.
Você é o barco ali parado.
E as suas ações são a vela, que podem aproveitar ao máximo, ou o mínimo, do vento que sopra.
Sem vento, em crise geral, o barco não anda de jeito nenhum, o que exige o remo… 😉
É essa inteligência emocional/cognitiva atrás de melhores taxas de ser no mundo que vai nos fazer sobreviver com mais ou menos potencial exercendo nossa taxa de SER mais ou menos.
Esse é o campo de batalha, que pode se desdobrar em projetos empresariais e mesmo políticos para ampliar o espaço do Ser coletivo.
Que dizes?
PS- perdi um amigo recentemente e fiquei pensando sobre que não temos muito tempo para adiar essa procura da melhor taxa;
PS1 – Post feito a partir de um papo com a Lucília.
Bom demais ver nosso papo processado aqui. Essa conversa tá ecoando em mim até hoje… Só que o texto me deixou com a seguinte questão:
O que fazer quando a nossa taxa de dharma é altíssima (de acordo com o criterio do prazer em fazer, estudar e saber cada vez mais) mas os ventos não sopram de jeito nenhum e a gente cansou de remar ???
Será que nessas condições o melhor a fazer é se entregar ao movimento das ondas e seguir o conselho do Zeca: deixa a vida, quer dizer, o mar me levar ???
Ser ou sobreviver, eis a questão!
bjs
Lu, se alguém soubesse…acho que é uma procura individual….tenho tentado ter um projeto pessoal, independente se dá grana….que é esse blog, meus estudos, outras coisas como poesia….se tem dinheiro, estou ganhando, quando escasseia, continuo por aqui….assim, me sinto sempre realizado….mas cada caso é um. bjs, valeu visita e comentário.
Este texto é absolutamente transformador para mim! =)
Vou usar mais meu óculos interno!
Obrigada, Nepô!
Tássia.
Tássia, que bom esse retorno me alimenta, grato,
Nepô.
Oi Nepô, ao contrário da Lu, meu dharma está baixinho, baixinho…
Adorei o texto, tirou a última casquinha da ferida, rs. Muito boa a reflexão, o óculos tá cada vez mais inquieto…
Tou içando a vela, só esperando o vento bater…
Uma beijoca.
Adorei! Obrigada pela inspiração! abs
Ana, qualquer incentivo nesse mar de desincentivo, que é o Brasil, sempre é bem-vindo, grato pela visita, comentário e apoio,
Nepô.
Nepo, ótimo post! Melhor ainda porque você traz uma reflexão muito séria e aplica na realidade do mundo 2.0.
A leitura do seu post me fez pensar numa coisa: numa sociedade capitalista onde MUITOS além de sobreviver, só querem PARECER, percebo que a maioria dos brasileiros ainda não sabem usar as ferramentas da internet a próprio favor e/ou ao coletivo. Muitos comentários que não levam ninguém ao lugar algum. Talvez tivéssemos que aprender primeiro a nos olhar para depois interagir.
beijos
Marcela, que tal se olhar e interagir, interagir e olha, duas ações que acabam, para quem está em processo de mudança, sendo quase única.
Grato pela visita e comentário.
Nepô.
Faço minha a pergunta de Lucília, que claro, não existe resposta e se existe são muitas (já que muda de pessoa para pessoa). Um grande amigo meu, escritor baiano, diz uma coisa que acho bárbara: “Não é a vida que está contida na gente, somos nós que estamos contidos na vida.” Acho mesmo q no final das contas tudo é Vida, tudo é Viver, incluindo o sobreviver.
Caesar, gostei bastante da frase…e acrescentaria “que nós estamos na vida, assim como a vida pode estar em nós…” porém, existem taxas…
E diria que é a nossa capacidade de superar o molde social em que nos colocaram e começar a ter uma “personalidade mais autêntica” do que a forma que nos colocaram, a tal “fora da caixa”.
Tudo é viver, mas podemos viver com mais liberdade de escolha ou mais prisão, isso depende tanto de movimentos individuais, como coletivos…
O sobreviver – nossa âncora eterna – sim faz parte desse processo,
valeu visita e comentário,
abraços,
Nepô.
Destaco uma frase sua aqui “não conseguir colocar o afeto naquilo que faz”. Isso realmente é complicado. Sempre tentei trabalhar buscando oxigenar esse lado, achando pontos que pudessem dialogar entre o “ser e o sobreviver”. Tentando achar “o que é mais nobre para o espírito” nestes dois pontos.
Mas e quando o seu afeto não é aceito, naquilo que faz, por não saberem lidar com isso. Por resistência as mudanças?
Quando fui convidado para o trabalho que estou hoje, levei comigo muita vontade, muito afeto, e nenhum ego (acredito). No começo implementei algumas mudanças, mas encontrei e encontro muita resistência a elas. falo de uma produção de 25 anos no mesmo formato. Acredito que nos últimos 3 anos que lá estou, teve mais mudanças do que nos 22 anteriores.
Mas são tantas as necessidades de mudança que esbarram no Ego, no comodismo, no “time que está ganhando não se mexe”. Quando vão perceber que não estão ganhando?
E mais, as relações de abuso. vejo muitas que nem são comigo, pois não me submeto a elas quanto os demais ali presente. Mas ver essas relações de abuso me incomodam demais. E isso vai “minando” a relação de afeto… Teremos que bater o ponto de entrada, ligar o “sobreviver”, levar assim até a hora de bater o ponto de saída, para poder Ligar o Ser em um ambiente externo?
Oi, Filipe! Tudo bem?
Como falamos ontem sobre este em sala, resolvi entrar aqui novamente, para tentar ajudá-lo de alguma forma. 🙂
Acredito que você já deu o primeiro passo para mudança: entrou na pós-graduação. Está vivenciando algo completamente novo, o que lhe permite fazer uma oxigenação e vislumbrar uma oportunidade que se encaixe mais com você.
Tens a consciência de que deu o ser melhor durante todo esse tempo de trabalho, que pôs sua afetividade nesse processo. Eis que surge a hora de voar para outros ares, não é mesmo? Onde você possa ser esse menino cheio de vida, esforçado e mais, ser reconhecido.
Estou aqui torcendo para que encontres um espaço que você possa ser. Também estou nessa busca, pois creio que vale realmente a pena sermos.
Um beijão!
Muita paz.