Não acredito que a literatura revela a realidade, acho que inventa a realidade – Ferreira Gullar – da coleção;
Um dos grandes problemas cognitivos com o qual me deparo é a crença enraizada e generalizada de que a realidade existe.
Falo isso por experiência de aulas, palestras, tanto que passei a introduzir como tema inicial a discussão “O que é a realidade?”.
(Será só no Brasil? / Talvez, isso se dê em função do fim das aula de filosofia nas escolas (???) / Tudo tem um preço!)
A filosofia estuda como pensamos.
E coloca entre a dita “realidade” e nós, algo no meio, um fosso.
Assim, não olhamos a realidade com nossos olhos, mas através de “óculos culturais”. Quanto mais invisível for este óculos, mais você é enganado pela “dita realidade”.
Alguém colocou o óculos na sua cara e você não se deu conta!!!
Nesse fosso filosóficos estuda-se nossas maneiras de pensar.
Cada um escolhe uma, ou mais normalmente, é escolhido por elas, pela família, escola, meios de comunicação de massa, grupo fechados de amigos.
(Precisamos de aceitação e cedemos sem sentir.)
Quanto mais você escolhe sua filosofia, mais você é.
Quanto menos, menos és.
Vão duas frases boas sobre isso:
- Aos poucos fui tentando transformar não mais as coisas, mas a mim mesmo – Herman Hesse;
e
- Pensar pela própria cabeça implica o enfrentamento dos dogmas –Gustavo Bernardo;
Pois ser é ter o direito a escolher, entre tantos, ao longo do tempo, o seu jeito de ser e pensar e ir mudando e se adaptando, a partir da interação com o mundo e os outros.
Ser é viabilizar nosso novo jeito de pensar o mundo!
Ou seja, somos seres filosóficos, conscientes ou inconscientes.
Ao adotarmos determinadas “verdades”, na qual a realidade se cristaliza, se embrutece, se consolida, levamos ao mundo dogmas fechados.
E nos dogmas, ideologias, crenças, fés não se mexe.
Já que:
“Estou no caminho “certo”!!!”
(Eu e todos os meus amigos e minha tribo, seja lá qual seja ela.)
Porém, se alguém está no certo, outro está no errado.
Deve-se trazer o outro para o certo.
E/ou criticar o outro, discriminá-lo, em alguns casos, até apredrejá-los.
Quando alguém diz que é XXXX, pertence a raça YYYYY ou tem o sangue WWWW.
Já está no Dogma.
Os defensores do caminho certo versus o errado acreditam que a sua vida, por consequência, é um exemplo para a humanidade, tanto de ética como de moral.
Ou seja, há um caminho certo: o meu!
É uma filosofia dogmática da ética e da moral.
Pois, para eles, o ser ético precisa se enquadrar dentro de uma caixa.
Porém, pode-se ser ético, sem ser imoral, ou abusivo.
E sem ter caixa, mas aberto para a relação com os outros.
O que chamaria de sabedoria.
Veja alguns aos quais me guio e note que neles não há uma norma atribuída por terceiros, mas sempre por quem a segue:
Coerência de Gandhi:
“Tens que ser a mudança que queres para o mundo”.
Respeito ao outro, Jesus:
“Não faça ao outro, o que não queres que faça contigo”.
E agente de mudança, com serendidade – dos AAs e similares:
“Que eu tenha serenidade para aceitar as coisas que eu não posso mudar, coragem para mudar as coisas que eu posso,
e sabedoria para que eu saiba a diferença”.
Note que nos três casos há um dado relacional, nestes princípios nem Gandhi, nem Jesus nem o AA definem como será a sua conduta no mundo.
Simplesmente, sugerem que use-se (auto-conhecimento + sabedoria) para se ter como referencial, aberto, sem líderes, no livre arbítrio, para que não leve ao outro aquilo que não queres para você, seja coerente e use a sabedoria para saber o caminho do que pode mudar ou não no planeta, sem ser passivo ou maluco.
E aí entra a questão da viabilidade existencial, que dá um outro bom ponto de referência. É preciso tudo isso e ainda ser sustentável.
Ninguém vai para a praia de smoking no verão de sol de 40 graus, pois é inviável, não é uma questão de certo ou errado.
O mesmo no trabalho, é preciso criar condições para que nossa maneira ética de estar no mundo se consolide.
E isso implica em economizar (não cair na lábia do consumismo), ter recursos, para escolher, optar e poder dizer não quando os limites dos princípios definidos por cada um estão sendo transpostos.
O viável depende de cada pessoa, de cada situação.
E essa ética relacional, não dogmática, que estamos precisando, ainda mais em um mundo de constante interação e inovação, como este que estamos entrando…
Tudo isso sempre sabendo que a realidade é inventada e depende de nós torná-la mais humana na medida das nossas forças.
Que dizes?
Pós- post: a questão do viável não foi bem explorada, volto ao tema depois.
Todos submetidos a latência. De um lado, os que aceitam a verdade pregada pelos outros. Do outro, os que pensam conhecer a verdade.
Assim como Ferreira Gullar não acredita que a literatura revele a realidade e sim a crie, concluo a seguinte questão: Será que viver não seria criar realidades? Acredito que a cada momento que um ser humano nasce, ele cria uma nova realidade, que será desenvolvida ao longo da sua vida e trajetória, com influências das já existentes, é claro, mas “o escritor” nesse caso, é ele, o redator final, acaba sendo cada um de nós: os verdadeiros escritores da realidade.
Bianca, infelizmente, a sociedade mais faz as pessoas para não criarem, mas repetirem, concordo com vc: “Será que viver não seria criar realidades? ”
Sim, repetir é deixar de ser, concordo 100%.
abraços,
Nepô.