Disse aqui que Cosmovisões têm determinada origem, um big bang.
Um dos questionamentos do Objetivismo é o questionamento dos pilares da Cosmovisão Cristã e as consequências que tiveram para as pessoas e sociedade.
É espécie de revisão geral da cosmovisão para dar início a outra, a partir dos resultados obtidos.
Ayn Rand, a meu ver, ao analisar a frase “ama o próximo como a ti mesmo”, simplesmente diz que isso é algo impossível.
Ela não questiona se as pessoas devem ou não fazer isso, mas simplesmente não acredita ser possível. Não é uma crítica emocional, moral, apenas objetiva.
“Vocês estão propondo algo que não dá para fazer.” Ponto.
E alerta que isso não só vai criar grave problemas para as pessoas como para a sociedade. E terá o efeito contrário do que está se propondo: as pessoas vão amar menos a elas e as outros!
A justificativa de Rand é a seguinte: cada pessoa precisa tratar de sua sobrevivência e para isso precisa se amar para se cuidar.
É o que diz a aeromoça: se o avião estiver com problemas, coloque a máscara antes em você e depois nos seus dependentes! (Grato Roberto Rachewsky pela dica.)
Cada Sapiens precisa, antes de tudo, se amar, se cuidar, prover o básico para si mesmo, só então, poder começar a se relacionar com os demais de igual para a igual, de inteiro para inteiro.
Se amar, antes de tudo, é base fundamental para amar o próximo!
Quando temos cosmovisão religiosa que influencia toda a sociedade, incluindo os não adeptos, isso passa a ter consequências sociais.
A primeira delas é de que cada pessoa que tenta “amar o outro mais do que a si mesmo” inicia jornada de tentativa e fracasso, o que resulta na culpa de não ter conseguido aquilo que é recomendado para ser uma pessoa de bem.
Cria-se ética impossível, não humana, e se gera uma divisão interna, pois não se pode alcançar aquilo que é considerado “o ideal”.
Há, por causa disso, o incentivo a uma baixa auto-estima e, de certa forma, incapacidade de aumentar a taxa de amor pelos demais, pois a pessoa está eticamente dividida.
Toda vez que pensa em si mesmo por necessidade prática – se sente mal.
Do ponto de vista social, temos ainda problema maior e mais grave.
Quando as pessoas deixam de considerar que se amar para sobreviver é algo fundamental para resolver os seus problemas de sobrevivência, começam a imaginar alguém que vá fazer isso por elas.
“Outro vai me amar mais do que a mim mesmo, então, vou esperar que ele chegue para me ajudar.”
E cria-se mentalidade anti-empreendedora individual, dependente da caridade e do altruísmo alheio.
Qual é a receita para reverter isso?
O Objetivismo prega uma outra ética, que seria a seguinte.
Ama-te a ti mesmo para depois poder amar a outro alguém de forma mais honesta e inteira.
É ética mais humana, mais próxima das pessoas, pois cada um, querendo ou não, vai precisar todos os dias resolver seu problema de sobrevivência. E isso não vai ser gerar uma divisão.
E mais: ao estar procurando, além de sobreviver, dando o máximo de si, da sua diversidade única, mais e mais a sociedade vai se aperfeiçoar.
É um tipo de cooperação de pessoas inteiras, diversas e únicas, que interagem de forma mais adulta e menos infantil.
Há espécie de alinhamento ético interno-externo, pois a pessoa não se sente culpada de amar a si mesmo mais do que aos outros, pois isso é fundamental para que todos, ao final, estejam melhores.
A procura do outro não será desonesta, pois ambos sabem que estão trocando sobrevivências.
Do ponto de vista social, a ética objetivista do “ama-te a ti mesmo para encontrar os outros de forma mais inteira”, nos leva a pessoas mais maduras, menos divididas, empreendedoras e mais independentes.
E aí temos algo interessante.
Numa sociedade de trocas, quando você ama a si mesmo e está procurando sobreviver, depende necessariamente do outro para poder gerar valor.
O compartilhamento sempre será necessário, não existem o ama-te a ti mesmo e se feche em casa, pois dessa forma não vai conseguir sobreviver.
O outro é base fundamental para felicidade de cada um. O que está se discutindo não é o encontro e nem a ajuda que vai se dar aos outros, mas justamente como serão as bases éticas dessas relações.
E aí há o que chamo de generosidade interessada.
Você procura entender o problema do outro para, ao mesmo tempo que o vai ajudar, conseguir sobreviver também. É troca ganha-ganha, inteiro-inteiro, sem criação de relações de dependência.
É uma troca aberta, mais madura e menos idealizada.
O Objetivismo é claramente contra-ponto ao pensamento cristão idealizado, que coloca no altar santos e padres (que sobrevivem do salário da igreja), mas que pedem aos fiéis para fazer o que é humanamente impossível.
(Ouvi um padre recentemente defendendo que a pessoa que passa dificuldade não deve duvidar da sua fé que Deus vai ajudá-la, numa atitude de dependência e passividade.)
Tais mitos aparentemente são inofensivos e fazem todo o sentido na direção de um mundo melhor.
Mas, na prática, acaba tendo consequências perversas tanto para as pessoas como para as sociedades.
É isso, que dizes?