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O que há de Darwiniano na obra de Lévy é que ele consegue admitir que existe, como Darwin, mais um agente que se encaixa na ideia de “Design cego”. De que quando dada tecnologia cognitiva altera a forma de comunicação a distância na sociedade, estamos diante de uma uma nova guinada da civilização. Ou seja, quando há esse momento de ruptura a sociedade muda, a despeito (porém ainda com influência) das tramas econômicas, políticas ou sociais. 

Versão 1.0 – 14 de maio de 2012
Rascunho – colabore na revisão.
Replicar: pode distribuir, basta apenas citar o autor, colocar um link para o blog e avisar que novas versões podem ser vistas no atual link.

Na história humana, há pensamentos, teorias, filosofias que são encruzilhadas para a maneira que pensamos a sociedade.

Estou lendo o divertido e polêmico livro do Pondé “História politicamente incorreta da Filosofia“.

Lá pelas tantas, ele apresenta as duas maneiras de pensar, completamente diferentes de dois filósofos: Rousseau e Hobbes.

  • O primeiro considera que o homem é bom, mas a sociedade o corrompe;
  • E o segundo, ao contrário, que o ser humano nasce “encapetado” e é a sociedade que tenta evitar que ele tire seus demônios para fora.

Os seguidores do primeiro, que nem sempre sabem que têm suas ideias vindas dali, têm uma série de atitudes na sociedade à procura de uma melhora contínua do humano, colocando o diabo do lado de fora – o mal é externo ao ser humano.

Os que acham que Hobbes está mais próximo da realidade, procuram, antes de tudo, achar o diabo dentro de si e analisar como vão administrá-lo melhor – viver é administrar meus demônios.

Thomas Hobbes

Ou seja, é um divisor de água.

A visão de Darwin sobre a evolução das espécies também nos leva a um impasse.

Além de analisar que o ser humano descende de alguma espécie próxima dos macacos, procurou defender que vivemos dentro de um ecosistema, no qual existe algo como um “design cego”, que pode nos levar, se aplicado à sociedade, a ações que estão acima das ideologias, da política, da nossa capacidade de intervenção.

(Obviamente, que há um jogo político aí, tanto de um lado como de outro. Aquilo que é passível de modificação humana e o que não é, mas vamos em frente.)

Darwin sugere que há movimentos de mudanças mais amplos ou genéticos/biológicos que o ser humano não tem controle, por mais que muita gente deteste a ideia de que há algo no mundo que não seja fruto da economia ou política e de um grupo de malvados dentro de uma sala tramando coisas contra a maioria.

(Isso também transita no livro do Pondé.)

Algo nessa linha, digo eu, pode nos levar a imaginar que existam movimentos coletivos que têm algo de incontrolável, tal como a mão invisível do mercado, aos movimentos de massa espontâneos (como o tamanho de um público de uma partida de futebol) e também à adesão em massa à tecnologias, incluindo a Internet, com respectivas mudanças em diversas áreas que tal tecnologia nos condiciona.

Isso está na ordem das visões macro, tal como macroeconomia, macrodemografia, macroecologia.

(Precisamos começar a pensar em movimentos de macrocognição – falarei mais sobre isso em breve.)

Vivemos um momento parecido.

São momentos em que a maneira de pensar o mundo nos coloca em uma divisão de águas, na maneira de pensar dado problema ou fenômeno.

 A maneira como vemos a Internet nos leva a rever como a sociedade muda e o próprio motor da história, que fica mais claro agora tem algumas peças fundamentais faltando.

Como estamos muito próximo do fenômeno,  não conseguimos analisar com o devido distanciamento o que temos como divisor nas diferentes formas de pensar sobre esse assunto.

A chegada da Internet, assim, e todo o fenômeno que se segue é algo que tem mexido com alguns curiosos pesquisadores da sociedade humana.

Podemos dizer que a Ciência trabalha movida por dois gatilhos:

  • fenômenos antigos que podem ser vistos de forma nova (incluindo novas tecnologias que nos ajude a observar de forma diferente, ou pensadores associativos que vêem tudo diferente);
  • fenômenos novos que nos impõem uma nova visão, como é o caso de fenômenos climáticos e doenças incomuns ou a chegada da Internet.

O que temos hoje, assim, é a tentativa de interpretação do fenômeno Internet.

  • Por que ela veio?
  • O que ela traz?
  • O que ela muda?
  • E o que devemos fazer para alinhar nossas vidas à ela?

São estas as questões que não querem calar nos estudos, encontros, na cabeça dos especialistas que discutem o tema direta ou indiretamente.

De maneira geral, as visões dita de mercado, mais superficiais, nos levam a algo de continuidade, de prosseguimento de outras mudanças tecnológicas de maneira geral e, em particular, da mídia, como a chegada do rádio e da televisão.

São formas indutoras de ver o problema, que partem dos fatos que estão ocorrendo coisas por aí, que se juntam para formar uma teoria possível, rapidamente a formar especialistas, para atuar nesse cenário, a partir de uma metodologia feita do mesmo modo – capenga.

O conceito da Web 2.0, de Tim O’Reilly (que não é pesquisador), que gerou todos os outros (cidades 2.0, empresas 2.0, governo 2.0, etc) é uma expressão mais clara dessa formação de conceito indutiva, já que é fruto da percepção “de que algo mudou muito” sem nenhuma consistência histórica, de algo que mudou hoje e também no passado seguindo macro-padrões mais gerais.

O fato de ele ter acertado na intuição, não quer dizer que nos ajude mais adiante a criar uma teoria, pois é preciso aliar a um conceito feliz, uma teoria eficaz.

Tim O'Reilly

Simplesmente estamos – ou caímos –  na Web 2.0, pois algumas coisas por aí mudaram, não se sabe bem o que era a Web 1.0 e nem quando podemos dizer que será a Web 3.0.

É a teoria do disco voador, caiu por aí de repente, devem ser marcianos. 😉

É uma teoria e conceito do modismo, com metodologias na mesma direção!

Existe no método dedutivo (da parte para o todo), alguns problemas, pois geralmente é uma análise a-histórica, uni-disciplinar e baseado nas coisas que vemos e não em reflexões e teorias que possam nos ajudar a ver melhor, mais de cima.

(Já escrevi aqui mais sobre a necessidade de termos métodos dedutivos para estudar a Internet.)

A meu ver, Pierre Lévy é o  Darwin do século XXI, com sua obra que começa a ganhar corpo desde 1995, há mais de 15 anos.

Lévy, por não ser americano que têm essa visão indutiva mais consolidada, vem formulando uma nova visão sobre o fenômeno, partindo de um método dedutivo, mais histórico, muti-disciplinar e mais consistente.

Lévy procura analisar a Internet como uma mudança particular que raramente ocorre, comparando-a a chegada da fala e da escrita. Separa tais tecnologias como algo particular: tecnologias cognitivas das tecnologias de aspecto geral. E analisar que tecnologias cognitivas alteram a forma básica da comunicação na sociedade.

Ou seja, estamos diante de novas tecnologias cognitivas que mudam a forma de comunicação das ideias na sociedade – que passei a chamar de tecnologias cognitivas desintermediadoras:

  • O mundo oral era a possibilidade da comunicação todos-todos, mas aprisionada na mesma hora e local;
  • O mundo da escrita e da mídia de massa fortaleceu a comunicação um todos, a distância;
  • E agora temos como o mundo digital, a possibilidade do todos-todos a distância.

O que há de Darwiniano na obra de Lévy é que ele consegue admitir que existe, como Darwin, mais um agente que se encaixa na ideia de “Design cego”. De que quando dada tecnologia cognitiva específica (desintermediadora) altera a forma de comunicação a distância na sociedade, estamos diante de uma uma nova guinada da civilização. Ou seja, quando há esse momento de ruptura a sociedade muda condicionada por esta, a despeito das tramas econômicas, políticas ou sociais, que servem não mais como pano de frente, mas de fundo.

É o que podemos chamar de mão invisível das tecnologias cognitivas disruptivas.

A análise da sociedade atual, a revisão da história com a chegada dessas tecnologias, nos levam a uma nova maneira de ver o mundo, pois as mudanças que ocorreram na sociedade com a chegada da escrita (Vide Grécia e tudo que ela significou para o mundo), a escrita impressa (vide Europa/EUA e as revoluções Francesa e Americana e tudo que os livros e jornais significaram para o mundo).

Assim, estamos falando de um novo fator relevante a ser incorporado ao “Design cego”, uma força que nos leva a mais uma impotência humana, que nos tira de novo de nossa onipotência e, por isso, tão difícil de lidar e aceitar.

Tal visão, mais difícil de ser absorvida, é a base teórica que precisamos para nos posicionar melhor nesse mundo e ver que não estamos passando, como diz Chris Andersen:

Não uma era de mudança, mas uma mudança de era.

A era cognitiva da comunicação um-muitos a distância para a era cognitiva da comunicação todos-todos a distância. E tudo que isso vai trazer para a sociedade humana e tudo que temos que fazer para no curto, médio e longo prazo abrir as oportunidades e lidar com os problemas que teremos pela frente.

É isso!

Que dizes?

 

2 Responses to “O design cego das tecnologias cognitivas”

  1. […] (Tecnologias cognitivas disruptivas têm esse poder de condicionar a sociedade de forma radical. Tal teoria elaborada por Lévy de forma clara tem o mesmo peso de mudanças teóricas na sociedade, na nossa maneira de pensar o mundo, tal como a teoria do inconsciente de Freud ou da Evolução de Darwin. Falei mais sobre isso aqui) […]

  2. Bruno disse:

    É… o desafio é esse. Temos que sair da bolha para poder analisá-la melhor!

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