É falsa a expressão “futuro do livro, da TV, do rádio”; mais adequada: “futuro da circulação de ideias” – Nepô, da safra 2011;
Estamos passando uma fase difícil, resistindo ao novo século que chega cheio de sangue novo.
Todos falam da preservação do livro, do rádio, da televisão, do jornal impresso.
Outro dia em uma palestra sobre rádio foi me subindo uma raiva e saiu uma frase:
“Ideias sonoras, saiam desse corpo que não te pertence (rádio)!”. 🙂
O ser humano precisa de significado.
Para tal, procura desenvolver canais de distribuição de ideias, seja por áudio, áudio e imagens e textos – os mais flexíveis e baratos que tiver as mãos.
Vamos sempre – enquanto formos humanos – precisar de ideias circulando em mídias disponíveis, as mais flexíveis e baratas que tivermos.
Ponto.
Existe os fetiches do antigo. OK.
Tem gente que desfila com carros de 1910.
Ok, são raridades interessantes, mas não serão elas que vão resolver os problemas de transporte do novo século.
Mas isso já disse e não vou repetir.
Quero falar do conceito novo: o livro vivo.
Note que quando escrevia um texto, eu era obrigado a concluí-lo, fechá-lo, editá-lo para publicá-lo em um meio que ia ser distribuído para as pessoas.
Ao imprimir um livro o autor concluía uma etapa de sua obra.
E fechava aquelas ideias em um determinado ponto.
E todos passavam a ter contato com aquele documento fechado.
Não há como alterá-lo se houver um erro, se ele mudar de ideia, se quiser acrescentar algo, pois aquele corpo não te pertence mais.
Está distribuído na mão dos leitores, já era!
É um canal de distribuição fechado na ponta, sem possibilidade de alteração.
No próprio contrato das editoras, o autor dá a ela o direito de copiar e do acesso aquele material. Em muitos casos, só pode alterar e mexer com a autorização da editora.
Esse é o modelo que marca profundamente a sociedade, pois condiciona nossos cérebros a pensar a produção de ideias dessa forma (fechada, pronta, acabada, distribuída sem possibilidade de alterar, já está).
Penso –> Organizo –> Publico –> Distribuem –> Acessam
O que dá uma falsa impressão que aquele autor fechou o seu pensamento, algo sólido, como se ele não continuasse a pensar sobre aquele assunto e fosse mudando.
O meio condiciona.
Esse tipo de característica da tecnologia do livro, que molda todo o nosso pensamento contemporâneo, pois é o principal canal de ideias no mundo, nos colocou em um ambiente fechado de conhecimento, lento, ilusoriamente não-mutante e não-participativo.
Podemos dizer que um livro em papel, então, quando sai parte do autor é morta, enterrada naquelas páginas.
O que começamos a ter com a Internet é um outro movimento, no caso deste blog, por exemplo, ou dos novos livros eletrônicos, por exemplo.
Quando eu publico um post, ele é centralizado num local, do qual eu tenho controle sobre as mudanças.
As pessoas estão também descentralizadas, mas vêm ao mesmo ponto buscar o texto.
As pessoas de diferentes lugares, meios, regiões, não recebem mais uma cópia exclusiva, mas vêm até mim acessar um texto central, no qual o autor tem controle e pode alterá-lo, não passando por intermediários (editora).
O que me permite estar sempre atualizando a obra, caso queira.
Já aconteceu muitas vezes alguém me alertar para um erro, comentar um trecho, sugerir uma mudança e eu mudar.
(Não sou daqueles que marco as mudanças, pois não vejo necessidade, o texto é vivo, quem entra num dia vai ver a versão daquele texto, naquele dia, pois me representa melhor. O texto, acho eu, tem que representar o que o autor pensa agora!)
Obviamente, que isso nos leva à diversas discussões sobre memória, preservação, etc, mas tirando isso, o que estou falando é outra coisa relevante e importante com a chegada dos leitores eletrônicos e textos centralizados em rede.
Existe uma macro-tendência em curso da produção de livros mortos para livros-vivos.
Ou seja, ao se ler um livro, por exemplo, na segunda, será diferente de ler o mesmo trabalho na sexta, pois o autor pode ter alterado algo.
E você, inclusive, pode pedir para acompanhar as alterações e até sugerir, ou colocar suas impressões nela.
Os livros passarão a ser centralizados, pois muita gente terá acesso a computadores com conexão o que nos levará a um controle maior do autor, que fará um texto muito mais vivo do que é hoje.
(Obviamente, que esse fenômeno ficará restrito a uma elite, porém é ela que define, infelizmente, os rumos do planeta e isso marcará a civilização, querendo ou não.)
O livro deixa de ser algo fechado e passa a ser aberto, o que tende a influenciar fortemente como pensamos a realidade.
Pois vamos ver o mundo muito mais perto do que de fato ele é: um processo vivo e dinâmico e não parado e estático, como os livros davam a sua impressão.
Um texto só irá estar concluído quando um autor não mais existir, mas mesmo assim teremos os seus seguidores, complementando a obra.
Ok, já é assim hoje com novas edições, mas será muito mais rápido e dinâmico, o que mudará bastante nossa percepção do real.
Seria algo como dizer que as novas edições serão revisadas muito mais rapidamente com o controle e a participação muito mais efetiva dos leitores, pois haverá a concentração dos comentários sobre o livro em um dado lugar.
Este é um dos (talvez o maior), a meu ver, impacto que teremos ao distribuir os livros eletrônicos, a passagem de uma percepção de uma realidade sólida para algo mais líquido, mais compatível com um mundo inovador e mais lotado que estamos.
Bem-vindo ao mundo do livro vivo!
Que dizes?
A internet reune recursos que facilitam a revisão de conteúdo, o acesso e a participação do usuário. Mas esses conceitos não nasceram com a internet. Livros podem ter novas edições publicadas, sendo uma revisão de conteúdo. Ao invés de ter uma cópia, a pessoa pode ter acesso (centralizado) ao conteúdo em uma biblioteca. O leitor pode entrar em contato com o autor e/ou a editora para expressar sua opinião sobre a obra sem utilizar a internet.
A internet atenua esses conceitos rompendo obstaculos como a utilização de matéria prima (papel, tinta) para gerar uma nova revisão, a distância do leitor para acessar o conteúdo e os meios de comunicação entre leitor e autor. Com esta ruptura, o custo cai, os meios mudam, mas as ideias não são novas.
Matheus, concordo, como até coloquei no texto…novas edições sempre existiram, mas veja bem:
vc disse:
“Ao invés de ter uma cópia, a pessoa pode ter acesso (centralizado) ao conteúdo em uma biblioteca. O leitor pode entrar em contato com o autor e/ou a editora para expressar sua opinião sobre a obra sem utilizar a internet.”
Sim, pode ir na biblioteca, mas será o mesmo livro que está na livraria e isso é uma mudança radical com a rede.
Neste exato momento neste post, com seu comentário, nós estamos acrescentando ao texto original a sua percepção e a minha reposta, isso é o que dá uma sensação mais líquida.
O contato com o autor era possível, com mais tempo, dificuldade, a diferença que eu falava com ele privadamente, agora você está incorporando esse contato ao texto que acabo de produzir.
Você está agora dentro da obra deste post.
Isso não é diferente?
Temos que separar ainda ideias de fenômenos.
Algo importante.
A ideia de revisão de textos, de novas alterações, de fato, não é nova, a necessidade de revisão, de mudanças;
O que é novo é a possibilidade que é feita hoje, o autor podendo alterar e todos lerem o mesmo texto, com suas incorporações.
Estou preparando um texto justamente sobre isso, o que é ideia nova e o que é fato novo.
Note que tem algo novo….bem novo que condiciona.
Concordas?
Abraços,
valeu visita e comentário!
Nepô.
O que entendo ser realmente novo é que saímos do paradigma da verticalização para o da horizontalização da informação, em todas as fases do processo: da produção à distribuição.
Suely,concordo, grato pela visita.