Acho que é um certo equívoco falarmos de ciência no singular e não no plural. E tenho cometido esse erro seguidamente. Chegou a hora de me chicotear.
Note que a ciência que estuda o que não é humano é bem diferente daquela que estuda o ser humano.
Existem coisas parecidas, mas é algo completamente diferente.
A ciência dos não humanos é algo que nos permite coisas espetaculares, tal como o isolamento do que não é humano, em muitos casos, no laboratório para promover experiências de forma isolada.
A ciência dos não humanos pode ser menos imprecisa, porém é uma ciência feita por humanos, o que muita gente, às vezes, esquece.
Note que o estudo de qualquer coisa que seja é feita por um humano, que tem a limitação da nossa miopia cognitiva crônica.
E digo mais, independente qualquer ciência, todo o registro do que é visto e percebido é feito em um documento escrito ou oral, que é o resultado do trabalho feito.
No fundo, toda a ciência se resume a um discurso científico registrado, que é o resultado do que aprendemos com as pesquisas feitas.
Ou seja, a ciência, seja ela qual for, tem a limitação da capacidade humana de ver, seja o estudo do humano ou do não humano e é registrada em um discurso qualquer.
Como diz o Gleiser a ciência é histórica, pois depende da nossa capacidade de medir. (Ele fala muito, como físico, da ciência do não humano.) No caso das ciências humanas, diria que ela depende da nossa capacidade de questionar o discurso produzido, diante de levantamentos de dados realizados.
A ciência humana, ou do estudo do ser humano e da sociedade, é mais complexa, pois o objeto é o próprio ser humano.
O ser humano é o ser mais complexo que conhecemos e está em eterno e irregular movimento.
Não dá muito para colocar pessoas em laboratórios como ratos, ou escavar sociedades vivas.
Assim, a ciência humana é mais complexa e mais afetada pela nossa miopia, além de haver mais interesses envolvidos, pois estudamos nós mesmos, o que já tem aí um problema de interesses, pois ninguém é neutro.
Note que na ciência não humana também há interesses, mas se formos graduar, dependendo da área, podemos dizer, que, no geral, há menos interesses.
Assim, é preciso separar quando falamos da ciência em explicitar as duas ciências, que têm grau de eficácia diferentes e possibilidade de algumas evidências mais ou menos distintas.
- Na ciência não humana, alguns consensos são mais evidentes e possíveis.
- Na ciência humana há maneiras de pensar diferente sobre diferentes problemas, o que nos leva a visões diferentes, ou escolas diferentes de pensamento.
É mais comum, devido às paixões envolvidas, de que na ciência humana tenhamos uma taxa de dogmatismo maior.
O dogmatismo é, no fundo, o casamento sem divórcio com determinados conceitos que se fixam no sujeito como um time de futebol.
Porém, há possibilidades de, mesmo com toda miopia e dogmatismo das ciências humanas avançar com algo que faça mais sentido, pois um discurso tem que ter coerência interna nele mesmo.
Assim, o primeiro passo da ciência humana, antes mesmo de ir a campo, é analisar se o discurso que está sendo proposto faz sentido. É como se fosse muito bom se pudéssemos dar um banho epistemológico nas proposições.
Isso economizaria muitas dissertações e teses, que saem da academia sem pé nem cabeça. E aí esbarramos em um engano que acredito que cometemos bastante, que é o da ciência aplicada e da ciência pura, como vemos aqui.
Versão 1.0 – 18/11/2013 – Colabore revisando, criticando e sugerindo novos caminhos para a minha pesquisa. Pode usar o texto à vontade, desde que aponte para a sua origem, pois é um texto líquido, sujeito às alterações, a partir da interação.
[…] Dando continuidade ao post passado, podemos dizer que não existe ciência pura. […]